sexta-feira, 17 de novembro de 2017

CARLOS DRUMOND DE ANDRADE




OS  OMBROS  SUPORTAM  O  MUNDO



Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho
e o coração está seco.

Em vão as mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.

Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.



3 comentários:

CÉU disse...

Meu querido Alfredo,

Esse poema só poderia ter sido escrito por Drummond.

Não conhecia esse escrito dele, mas fiquei boquiaberta de certeza. Sabe, o que eu estou sentindo? Pois, é isso mesmo. O mundo e suas traições são menos pesadas que nossos ombros, então, daí, a tristeza, a solidão, as intempéries da vida são zero, perante tudo isso.

Pega minha mão, virtualmente, e vamos viver!

Beijos com imenso carinho e amizade.

CÉU disse...

Deixa eu te dizer uma "coisinha": AMAR é um VERBO e não um determinante ou pronome POSSESSIVO.

Beijo e se divirta!

Valéria disse...

Rangel,
Amo Drumont...
Simples assim.
Valéria