sábado, 31 de outubro de 2015

No teu rosto






MIA COUTO

No teu rosto
competem
mil madrugadas

Nos teus lábios
a raiz do sangue
procura suas
pétalas

A tua beleza
é essa luta de
sombras
é o sobressalto da
luz
num tremor de
água
é a hora da paixão
mordendo o meu
sossego



Ilustração obtida no bolsademulher.com

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Eterno





Apraz-me saber de tua ânsia,
em tudo semelhante à minha.
As angustiantes noites,
idênticos sorrisos,
compartilhados desde sempre.
Querer que desafia sonhos,
eternos como teu olhar.
Querer o que era impossível.

Para sempre...





ilustração obtida em licuri.wordpress.com

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Eu não voltarei



JUAN  RAMON  JIMENEZ




Eu não voltarei. E a noite
morna, serena, calada,
adormecerá tudo, sob
sua lua solitária,
Meu corpo estará ausente,
e pela janela alta
entrará a brisa fresca
a perguntar por minha alma.

Ignoro se alguém me aguarda
de ausência tão prolongada,
ou beija a minha lembrança
entre carícias e lágrimas.

Mas haverá estrelas, flores
e suspiros e esperanças,
e amor nas alamedas,
sob a sombra das ramagens.

E tocará este piano
como nesta noite plácida,
não havendo quem o escute,
a pensar, nesta varanda.



Imagem obtida no Google


domingo, 18 de outubro de 2015

Lembrete



Flora  Figueiredo


Não deixe portas entreabertas.
Escancare-as
ou bata-as de vez.
Pelos vãos, brechas e fendas
passam apenas semiventos,

meias verdades
e muita insensatez.





Imagem obtida em bruxapoetisa.wordpress.com

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Distante cais



dormimos ancorados
no princípio do cais, num
porto distante,
desconhecido,
em noite tão fria, tão escura...
nem o luar, presa fácil,
surgiu então.

isso foi o princípio de tudo,
quando o amor nasceu...



Ilustração obtida no flickr


terça-feira, 13 de outubro de 2015

Impressionista




ADÉLIA PRADO


Uma ocasião
meu pai pintou a casa toda
de alaranjado brilhante.
Por muito tempo moramos numa casa,
como ele mesmo dizia,
constantemente amanhecendo.





Ilustração obtida em: omelhordiademinhavida.com

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

As palavras começam a ficar velhas





MARIA  DO  ROSÁRIO  PEDREIRA


As palavras começam a ficar velhas: têm
dores nas articulações e rangem, de vez
em quando, sem razão: reclamam óleos
e resina, tempo e açúcares mais lentos.

Mas também eu estou velha demais para
oficinas, tão cansada de livros e papéis,
morta por viver outras coisas - por amor.

Talvez espreitasse de novo nas mangas do
mundo e escrevesse uma fiada de búzios
no pulso da areia. Mas quantos dos teus
beijos perderia? Perdoem-me os que

ainda esperam por mim. Não sei se volto.




Ilustração obtida no dn.pt